Análise da Reforma Tributária: Um caminho que pode levar o Brasil a ter um dos maiores impostos do mundo
A reforma tributária do Brasil, cujo texto-base foi aprovado pelo Senado no dia 12 de dezembro de 2024, está em processo de tramitação e ainda pode passar por novas alterações na Câmara dos Deputados antes de ser sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Apesar das modificações propostas por senadores, o projeto mantém seus princípios de simplificação, neutralidade e não cumulatividade. No entanto, as estimativas apontam para uma alíquota média do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) que pode ultrapassar os 28%, o que faria do Brasil o país com o maior IVA do mundo, superando a carga de 27% da Hungria.
Principais desafios e contexto da Reforma
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A reforma tributária visa substituir diversos tributos estaduais e federais, com o IVA unificando o sistema. Contudo, a introdução de exceções para setores específicos, como isenções e benefícios, pode fazer com que a alíquota geral do IVA seja mais elevada do que o esperado. Esse aumento ocorre devido à necessidade de equilibrar a carga tributária, que não pode ser reduzida com as isenções propostas, mas tampouco pode ser transferida de maneira indiscriminada para a população, como aponta Tathiane Piscitelli, especialista em direito tributário da FGV.
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Estudos indicam que o Brasil gasta em torno de 70% do seu Produto Interno Bruto (PIB) com contenciosos tributários, um valor alarmante quando comparado aos 1% do PIB dos Estados Unidos. O sistema tributário brasileiro é considerado um dos piores do mundo, com as empresas gastando em média 1.700 horas anuais para cumprir as exigências tributárias.
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A matriz tributária brasileira, altamente concentrada no consumo, é outro fator que contribui para a alta alíquota do IVA. Enquanto países desenvolvidos possuem uma tributação mais equilibrada entre patrimônio, renda e consumo, no Brasil a maior parte da carga recai sobre o consumo. Isso resulta em um impacto maior sobre os mais pobres, que acabam pagando proporcionalmente mais impostos do que os mais ricos.
Exceções e seus impactos
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Apesar da intenção de simplificar o sistema, a inclusão de isenções e regimes especiais para setores específicos pode reduzir os efeitos positivos da reforma. Por exemplo, a decisão do Senado de excluir armas e munições do Imposto Seletivo (IS), um tributo sobre produtos prejudiciais à sociedade, transfere o custo da violência armada para toda a população, como destaca Tathiane Piscitelli. A remoção das armas do IS, devido à pressão da "bancada da bala", resultará em uma redução de 70% na tributação desses itens.
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Além disso, especialistas como Marcus Pestana, presidente da Instituição Fiscal Independente (IFI), ressaltam que a reforma pode gerar um "hiato de conformidade" que, embora busque melhorias, pode abrir novas brechas para a sonegação e a judicialização. A alta alíquota do IVA é uma consequência da necessidade de cobrir essas exceções e garantir que a carga tributária seja mantida.
Benefícios da Reforma Tributária
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Apesar das dificuldades e críticas, a reforma traz também aspectos positivos. A simplificação do sistema tributário pode reduzir os custos operacionais das empresas e tornar o ambiente de negócios mais eficiente, como explica o economista Eduardo Fleury. A transparência nos preços e a simplificação do processo podem beneficiar os consumidores e reduzir os custos de administração tributária.
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A reforma também traz avanços importantes para a sociedade, como a redução de alíquotas para itens essenciais, como fraldas, e o cashback para serviços de telecomunicação. A isenção para carnes, que visa aliviar o custo da alimentação para as famílias de baixa renda, é outro exemplo de uma medida que visa minimizar os impactos da reforma.
Repercussões no setor econômico
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A reforma tributária também tem impactos significativos em diferentes setores da economia. Enquanto entidades como a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) e a Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e Bebidas celebram os benefícios trazidos pela reforma, como a redução da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) para a Zona Franca de Manaus, outras entidades, como a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), criticam os privilégios concedidos a essa região, que podem prejudicar a competitividade de outras áreas do Brasil.
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Além disso, a Associação Comercial de São Paulo (ACSP) alerta para os possíveis danos que a reforma pode causar às pequenas empresas, que podem enfrentar dificuldades diante de grandes corporações que se beneficiarão de mais incentivos fiscais.
A reforma tributária do Brasil, embora com falhas e exceções que podem elevar a alíquota do IVA, representa um avanço importante para o país. A simplificação do sistema tributário e a redução de custos operacionais são aspectos positivos que podem impulsionar a economia a longo prazo. No entanto, a criação de exceções e privilégios para setores específicos e regiões, bem como a alta alíquota do IVA, podem ter impactos negativos na justiça tributária e na competitividade entre as diferentes regiões do país. A reforma, ainda que não seja ideal, traz um cenário de melhoria, mas exige acompanhamento e ajustes contínuos para evitar que as desigualdades e as brechas fiscais aumentem.