Para onde vão os votos de Pablo Marçal? O destino do voto na "Marçalândia" em São Paulo
A eleição municipal em São Paulo trouxe uma dinâmica interessante com a candidatura de Pablo Marçal (PRTB), ex-coach e empresário, que conquistou 28% dos votos
no primeiro turno. Marçal quase chegou ao segundo turno, ficando apenas 56,8 mil
votos atrás de Guilherme Boulos (PSOL). O atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB), ficou em primeiro lugar com 29%
dos votos.
A região da Zona Leste (ZL), que concentra o maior colégio eleitoral da cidade com 3,2 milhões de eleitores
, foi um dos pontos onde Marçal obteve grande destaque. Ele venceu em 14 das 20 zonas eleitorais da ZL, além de ganhar em seis zonas da Zona Norte, formando o que ficou conhecido como "Marçalândia" – um corredor de bairros que vai de Itaquera até o Tucuruvi, passando por Mooca, Penha e Vila Maria.
A Base de apoio de Pablo Marçal
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Pablo Marçal foi um nome que representou uma "esperança de mudança" para muitos eleitores. Seu perfil empresarial e sua proposta de não ser assistencialista, mas sim de "prover condições para que as pessoas trabalhem", conquistou boa parte do eleitorado de classe média da Zona Leste. Marçal captou um sentimento de frustração com a classe política tradicional, visto por seus eleitores como um "rosto novo na velha política".
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Eleitores como Marcos Dorça, de 47 anos, morador da Mooca, veem em Marçal uma figura que se alinha à ideia de que o Estado não deve ser assistencialista, mas deve fornecer meios para que as pessoas conquistem seu próprio sustento. Marcos, empresário do setor de tecnologia, apontou que o trânsito e a carga sobre a classe média são seus maiores motivos de revolta. Ele destaca que a classe média "sustenta o país", mas se sente sobrecarregada.
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Outro exemplo é o comerciante Celso Rossi, de 71 anos, de Itaquera, que se identificou com as ideias de Marçal por sua visão empreendedora. Ele aponta que a política precisa de renovação, e a vitória de Marçal em bairros como Itaquera demonstra um desejo de sair da "mesmice".
As razões da derrota
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Apesar do bom desempenho, Pablo Marçal não conseguiu avançar ao segundo turno, e muitos de seus apoiadores culpam sua postura agressiva. Marçal foi criticado por atacar demais seus adversários, infantilizando a campanha. Um dos momentos que mais impactou negativamente sua trajetória foi quando divulgou um laudo toxicológico falso sobre Guilherme Boulos. Isso foi visto por eleitores como uma linha de ataque que passou do limite e comprometeu sua imagem de renovador.
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Além disso, seu comentário machista sobre o cérebro das mulheres também repercutiu mal, especialmente entre o eleitorado feminino, que representa a maior parte dos eleitores.
O futuro dos votos de Marçal
Agora que Marçal está fora da disputa, a grande pergunta é: para onde vai o voto da "Marçalândia"?
Marçal sugeriu que metade de seus eleitores poderiam migrar para Boulos, destacando que o candidato do PSOL "sabe falar com o povo"
. No entanto, uma pesquisa do Instituto Datafolha mostrou que 84%
dos eleitores de Marçal pretendem votar em Ricardo Nunes no segundo turno. Esse é o caso de muitos entrevistados nesta reportagem, que optaram por Nunes, apesar de apoiarem Marçal inicialmente.
Análise e impactos
O cientista social Tiaraju Pablo D'andrea, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), analisa a ascensão de Marçal como um reflexo do "mito da Zona Leste". Historicamente considerada uma área prejudicada, a ZL hoje representa uma classe média que sente o peso da precarização do trabalho e da informalidade, e que busca alternativas fora da política tradicional. Marçal ofereceu uma "falsa saída", segundo D'andrea, ao colocar o empreendedorismo como solução para todos os problemas, desconsiderando a importância das políticas públicas.
Além disso, ele divide a Zona Leste em quatro núcleos distintos:
- Os bairros mais afastados, como Guaianazes e Itaim Paulista, tendem a votar mais à esquerda, por estarem mais precarizados.
- A "periferia em transição", como Itaquera e São Miguel, mistura características de classe média baixa e periferia, sendo distritos pêndulos que podem votar tanto na esquerda quanto na direita, dependendo do momento eleitoral.
- Bairros tradicionais como Penha e Vila Formosa têm uma população mais conservadora e envelhecida, que costuma votar mais à direita.
- Por fim, a Mooca e o Tatuapé representam o epicentro do bolsonarismo, com uma classe média rica, formada por empresários que tendem a apoiar candidatos de direita.
A votação expressiva de Pablo Marçal na Zona Leste e em parte da Zona Norte de São Paulo reflete o desejo de muitos eleitores por mudanças e uma saída da política tradicional. No entanto, o comportamento de Marçal durante a campanha prejudicou sua imagem e contribuiu para sua derrota. No segundo turno, a maioria dos eleitores de Marçal parece inclinada a apoiar Ricardo Nunes, mas ainda há um certo movimento que pode considerar Guilherme Boulos como opção. O futuro político de Marçal, entretanto, está em xeque, com ele mesmo prometendo concorrer novamente em 2026.