A expansão da cocaína no mundo: Mais forte, mais pura e mais disponível
Nos últimos anos, o mercado global de cocaína atingiu números inéditos, tanto em oferta quanto em consumo. Segundo o Relatório Mundial sobre Drogas da ONU de 2024, nunca houve tanta cocaína disponível, e o número de usuários ultrapassou 23,5 milhões de pessoas entre 15 e 64 anos. Este aumento é impulsionado por uma combinação de alta produtividade na América Latina e crescente demanda global.
Por que há tanta cocaína disponível?
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A América do Sul, especialmente Colômbia, Bolívia e Peru, responde por quase 100% da produção mundial de cocaína. Inovações no cultivo e o uso de novas variedades da planta de coca aumentaram a produtividade:
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Melhoramento genético tornou as plantas mais resistentes e mais ricas em alcaloides.
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Aumento na área de cultivo, que chegou a 355 mil hectares entre 2021 e 2022, um crescimento de 12%.
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O fim da fumigação aérea com herbicidas na Colômbia também contribuiu para esse cenário. Sem essa barreira, os produtores passaram a colher mais vezes ao ano, gerando quantidades recordes de cocaína pura, que atingiu 2.757 toneladas em 2022 — 20% a mais do que no ano anterior.
A droga mais pura e barata
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O mercado europeu, o segundo maior consumidor de cocaína, destaca-se pelo aumento da pureza da droga. Atualmente, a cocaína vendida é 45% mais pura do que há uma década, mas o preço permanece estável. Para os usuários, isso significa maior acessibilidade.
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Essa tendência não é exclusiva da Europa; dados apontam um crescimento na pureza em escala global. Entretanto, o consumo intensificado traz riscos à saúde e aumenta a violência associada ao tráfico.
Impactos do aumento da oferta
O excesso de cocaína no mercado tem consequências preocupantes:
- Mais violência nos países de trânsito, como Equador e Caribe, onde os cartéis competem pelo controle das rotas.
- Crescimento do consumo local, inclusive no Brasil, que, devido à sua posição estratégica no Atlântico, é um dos principais pontos de passagem da droga.
- Além disso, o aumento da pureza e a popularização da droga em diferentes estratos sociais ampliam os danos à saúde pública.
Impactos para a saúde pública no Brasil e no mundo
No Brasil:
- Sobrecarga no sistema de saúde pública: O consumo elevado de cocaína e derivados, como o crack, leva ao aumento de internações por dependência química e tratamentos para complicações relacionadas ao uso, como infartos, AVCs e distúrbios psiquiátricos.
- Desafios em comunidades vulneráveis: A disseminação do crack em áreas pobres do país intensifica problemas como violência, abandono familiar e dificuldade de reabilitação.
No mundo:
- Aumento de overdoses: Em países onde a pureza da droga aumentou, como EUA e Europa, há registros de mais casos de overdose e intoxicações graves.
- Crescimento de doenças infecciosas: Usuários de cocaína injetável estão mais propensos a contrair HIV e hepatites devido ao uso de seringas compartilhadas.
- Impactos na saúde mental: A dependência química está associada a um aumento significativo de casos de ansiedade, depressão e comportamentos suicidas, o que gera uma demanda crescente por serviços de saúde mental em vários países.
O avanço do crack na Europa
- Um efeito colateral do aumento da oferta de cocaína é a maior disponibilidade de crack, uma versão cristalizada e altamente viciante da droga. Grandes cidades europeias, como Frankfurt e Berlim, enfrentam desafios crescentes com o surgimento de "cracolândias" e aumento de 42% nos atendimentos a dependentes de crack entre 2017 e 2022.
Mudança de perfil nos consumidores
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Enquanto os EUA permanecem o maior mercado de cocaína, a Europa tem registrado um crescimento mais expressivo. O consumo é associado a uma imagem de status e aceitação social, diferente do estigma que o crack carrega nos Estados Unidos.
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Novos mercados emergentes, como Índia e China, também começam a registrar aumento no consumo, impulsionados pelo crescimento das classes médias que têm maior poder de compra e frequentam ambientes onde a droga circula.
O avanço global da cocaína reflete mudanças na produção, consumo e impacto social. No Brasil, os desafios recaem sobre o sistema de saúde pública e a segurança, especialmente nas comunidades mais afetadas. Globalmente, a crise de saúde pública exige atenção para complicações médicas e sociais associadas ao uso crescente da droga. Enfrentar essa crise demanda estratégias inovadoras e colaboração internacional para conter a oferta e reduzir o impacto destrutivo da droga.