Chacinas no Brasil: Entendendo a violência e seus impactos na sociedade
As chacinas, definidos como homicídios múltiplos em que três ou mais pessoas são assassinadas no mesmo local e de forma organizada, têm sido uma constante na sociedade brasileira. A seguir, vamos explorar o fenômeno das chacinas com uma visão sociológica, detalhando sua história, características e consequências.
O que são chacinas e como elas evoluíram?
As chacinas no Brasil não são algo recente, e sua evolução ao longo dos anos revela mudanças significativas tanto nas práticas quanto na percepção pública da violência. Aqui estão alguns marcos históricos:
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1938: O assassinato de quatro pessoas no bairro do Brás, em São Paulo, durante o carnaval, chocou o país. Esse tipo de homicídio múltiplo, na época, era tratado como algo excepcional.
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2015: Em um episódio marcante, mais de 20 jovens foram executados em Osasco e Barueri, em menos de três horas. Este foi um dos maiores casos de chacina do estado de São Paulo.
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2019 e 2023: A violência também se manifestou de novas formas, como no Massacre de Paraisópolis, onde nove pessoas foram mortas por policiais, e nas Operações Escudo e Verão, que mataram mais de 80 pessoas, marcadas por evidências de execuções sumárias.
Esses eventos mostram como as chacinas, que antes eram escondidas e tratadas como ações criminosas fora da lei, passaram a ser executadas de forma mais aberta, e muitas vezes, com a justificativa de operações policiais.
O papel do estado: Chacinas durante a ditadura militar
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Para entender as chacinas de hoje, é importante voltar à Ditadura Militar, quando o Esquadrão da Morte ganhou notoriedade. Esse grupo de policiais civis foi responsável por execuções extralegais, geralmente em comunidades periféricas, como forma de vingança institucional contra a resistência política. Eles matavam suspeitos de envolvimento com o regime, sendo essa violência parte de uma lógica mais ampla de repressão.
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Além disso, o Esquadrão da Morte também atuava como um "protetor" de grupos criminosos, negociando informações e serviços para traficantes, um processo conhecido como mercadorias políticas. Essas práticas criaram um ciclo de violência que ainda ressoa nas ações de chacinas nas periferias urbanas de hoje.
Quem são as vítimas das chacinas?
A análise de dados sobre chacinas, entre 2009 e 2020, revelou padrões importantes sobre as vítimas e os locais onde as mortes acontecem:
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Vítimas: A maioria das vítimas de chacinas é composta por homens (78%), com idades entre 18 e 29 anos. Esses jovens, em sua grande maioria, pertencem a comunidades periféricas e são, em grande parte, negros ou pardos.
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Locais: As chacinas acontecem em bairros periféricos, especialmente em locais de convivência urbana como bares, festas e praças. Esses espaços são frequentemente associados à sociabilidade nas periferias, e as chacinas muitas vezes parecem ter o objetivo de sufocar esse tipo de vida social nessas áreas.
Ao analisar esses dados, é possível observar que as chacinas se concentram em áreas de alta concentração de população negra, o que reforça a tese de um genocídio da juventude negra, como têm denunciado ativistas e movimentos sociais.
Como as chacinas são realizadas?
As chacinas seguem um modus operandi que apresenta alguns padrões em comum:
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Meios de execução: Ações rápidas, com os criminosos chegando em motos ou carros, usando coturnos e toucas ninjas para esconder a identidade.
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Ameaças: Muitas vezes, antes de cometer os assassinatos, os executores anunciam sua presença com frases como “é a polícia”, criando um clima de pavor.
Apesar de esses padrões ainda serem visíveis em muitos casos, houve uma mudança importante a partir de 2019, com a quebra do modus operandi tradicional. As chacinas passaram a ser realizadas de forma desencapuzada, ou seja, os executores já não se escondem mais, e as operações passaram a ser justificados como parte da ação policial oficial, como visto no Massacre de Paraisópolis e nas Operações Escudo e Verão.
O impacto das chacinas: Mais do que um crime, uma violência estrutural
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As chacinas não são apenas uma questão de crime violento; elas refletem um padrão mais amplo de exclusão e violência estrutural. A concentração de vítimas nas periferias, especialmente as vítimas jovens e negras, mostra como a violência letal é direcionada para aqueles que já são marginalizados pela sociedade.
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O genocídio da juventude negra, que é uma crítica central às chacinas, não é apenas uma metáfora; é uma realidade trágica que se reflete nas estatísticas, nas atitudes dos policiais e na ausência de medidas efetivas para proteger essas comunidades.
A necessidade de enfrentar a violência estrutural
- As chacinas, como vimos, têm raízes profundas na história do Brasil, e sua perpetuação não é fruto apenas de ações criminosas isoladas, mas de um sistema que marginaliza populações inteiras, principalmente jovens negros das periferias. A mudança no modus operandi das chacinas, agora justificadas por operações policiais, é um reflexo da normalização da violência estatal.
É urgente que o Estado tome medidas mais efetivas para combater essa violência, ao mesmo tempo em que é necessário um trabalho de base para promover a inclusão social, racial e territorial das comunidades periféricas. Só assim será possível interromper o ciclo de violência que assola as favelas e as periferias do Brasil, e que tem impacto direto na vida dos jovens negros do país.