Análise: PEC da segurança pública - Solução real ou mais um erro na luta contra o crime?
A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que busca aumentar a presença do governo federal na segurança pública dos estados gerou intensos debates desde sua apresentação pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski. O objetivo central da proposta é ampliar as atribuições da União e melhorar a integração entre as polícias por meio da constitucionalização do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), criado em 2018, mas nunca plenamente implementado. No entanto, a PEC enfrenta resistências políticas e críticas sobre sua real eficácia no combate à criminalidade.
Pontos principais da PEC
Maior participação da União na segurança pública
- A proposta busca fortalecer a presença do governo federal no combate ao crime organizado e à violência.
- Para isso, sugere a criação de uma nova polícia ostensiva federal a partir da extinção da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Integração das forças policiais
A PEC quer transformar o SUSP em um mecanismo realmente funcional, promovendo cooperação entre as polícias federal, estadual e municipal.
Unificação dos fundos de segurança pública
Os recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública e do Fundo Penitenciário Nacional seriam unificados para garantir financiamento constante para ações de segurança.
Mudança nas funções da Polícia Federal
A Polícia Federal teria suas funções redistribuídas, com parte de suas atribuições sendo transferidas para a nova polícia ostensiva federal.
Críticas e limitações da proposta
- Conflito com a autonomia dos estados
Governadores, especialmente os de oposição, interpretaram a PEC como uma tentativa de intervenção federal, reduzindo a autonomia estadual sobre a segurança pública. - Modelo policial ineficaz sendo replicado
A justificativa para criar uma polícia ostensiva federal se baseia no modelo estadual de duas polícias (Civil e Militar). Contudo, esse modelo é altamente criticado por sua ineficiência e baixas taxas de resolução de crimes. - Enfraquecimento da Polícia Federal
Em vez de fortalecer a Polícia Federal para atuar no combate ao crime organizado e nas fronteiras, a PEC sugere redistribuir suas funções, o que pode enfraquecer seu papel estratégico. - Problemas estruturais não são abordados
A PEC não trata de questões fundamentais, como a modernização das investigações criminais e a melhoria da inteligência policial. - Distração do verdadeiro debate
O foco excessivo na questão da autonomia federativa pode desviar a atenção de problemas centrais, como o financiamento da segurança e a necessidade de reformas no sistema policial brasileiro.
A realidade da segurança no Brasil
- O Brasil registrou uma taxa de 22,8 homicídios por 100 mil habitantes em 2023, quase quatro vezes maior do que a média global de 5,8.
- Apenas 35% dos homicídios entre 2015 e 2021 foram solucionados, um índice muito abaixo da média global de 63%.
- O crime organizado continua a crescer, impulsionado por falhas na fiscalização de fronteiras e pela ineficiência das forças de segurança no combate ao tráfico de armas e drogas.
Alternativas mais eficientes
- Fortalecimento da Polícia Federal
Em vez de criar uma nova polícia, a União poderia investir na modernização e ampliação da Polícia Federal, permitindo que atue de forma mais eficaz no combate ao crime organizado e à violência transnacional. - Ciclo completo de polícia para a PRF
A Polícia Rodoviária Federal poderia ganhar autonomia para investigar crimes relacionados às rodovias federais, sem necessidade de criação de uma nova força policial. - Reforma estrutural do modelo policial
Em vez de replicar um modelo ineficiente, seria necessário discutir uma reorganização completa das polícias para torná-las mais eficientes e integradas. - Fortalecimento da inteligência e tecnologia na segurança pública
A segurança pública precisa de investimento em tecnologia, análise de dados e inteligência policial para combater o crime de forma mais estratégica.
A iniciativa do governo federal em buscar soluções para a segurança pública é válida e necessária, mas a forma como a PEC foi apresentada gerou mais ruído do que avanços concretos.
- A proposta não enfrenta os principais problemas estruturais da segurança pública no Brasil.
- Em vez de investir em melhorias, ela replica um modelo falho e desvia funções da Polícia Federal.
- Existem alternativas mais eficazes, como modernizar a PF, conceder mais atribuições à PRF e reformar o modelo de policiamento nos estados.
Se o Brasil quiser realmente avançar na segurança pública, será preciso um debate mais amplo e menos político, focado em soluções de longo prazo. Caso contrário, essa PEC pode ser apenas mais uma tentativa frustrada de resolver um problema tão complexo.